sexta-feira, 27 de setembro de 2013

Querido Diário Capítulo 03


Naquela noite, porém, a cadeira de papai permaneceu vazia à mesa. As horas se arrastaram, tecendo uma teia de apreensão entre mamãe e eu. A noite inteira aguardamos, em vão. Telefonamos para seus companheiros de trabalho, a voz embargada pela crescente angústia, mas ninguém soube nos dar notícias.
Onde estaria nosso farol, nosso porto seguro?
Mamãe não pregou os olhos, a sombra da preocupação dançando em seu rosto à luz trêmula do abajur. A madrugada a encontrou na mesma vigília silenciosa, mas papai não voltou. Jamais, desde o meu nascimento, ele havia se ausentado por tanto tempo.
— O papai não vem para casa, mamãe? Minha voz era um fio de esperança hesitante.
— Vem, meu amor. Vá para a cama, eu o esperarei. A voz de mamãe, embora tentando ser firme, carregava um eco de sua própria aflição.
— Me acorde assim que ele chegar, mamãe. O sono era um inimigo que eu relutava em abraçar.
— Tudo bem, meu anjo. Agora vá, amanhã você tem escola. E não quero você dormindo no sofá, feito um anjinho perdido.
— Não me importa, mamãe. A única coisa que meu coração suplica é a volta do papai. A preocupação já me roubou a paz. Ele nunca se atrasou assim.
— Ele deve estar fazendo hora extra, querida. Uma tentativa frágil de acalmar minha crescente apreensão.
— Papai nunca fez hora extra, mamãe. Ele sempre guardou cada minuto livre para nós. Se ele não voltar logo, eu vou chamar a polícia! A ideia, embora assustadora, era um grito desesperado do meu medo.
— Vá dormir, Diana. Amanhã as aulas te esperam. A voz de mamãe era um misto de exaustão e súplica.
— Tudo bem, mas antes de fechar os olhos, pedirei a Deus que proteja o meu pai. A fé era o último refúgio em meio à escuridão da incerteza.
— Faça isso, minha filha. Se existe alguém que pode nos amparar neste momento, esse alguém é Deus. Ele nunca nos desampara. A voz de mamãe era um sussurro de esperança.
— Boa noite, mamãe.
— Boa noite, meu amor.
Não queria que o fardo do meu medo se somasse ao sofrimento de mamãe. Com o coração pesado, me deitei, mas antes, minhas palavras se elevaram em uma prece silenciosa: Senhor meu Deus, por favor, envolva meu pai em Teu manto protetor. Onde quer que ele esteja, guie-o de volta para casa, são e salvo. Imploro, não permita que nenhum mal o alcance.
A manhã nasceu sem trazer o alívio da volta de papai. Mamãe, com o rosto marcado pela noite em claro, dirigiu-se à delegacia. Mas antes que pudesse cruzar a porta, um telefonema cortou a nossa angústia como um raio de sol em meio à tempestade. Papai havia sofrido um acidente. A notícia nos atingiu como um choque gelado, mas a continuação trouxe um fio de esperança: ele estava sem documentos, sem seu fiel companheiro, o celular, e inconsciente. Ao recobrar os sentidos, sua primeira preocupação foi nos avisar, ditando o número de mamãe para que a notícia chegasse até nós. Graças aos céus, nada de tão grave, apenas uma fratura teimosa na perna. Mas papai era forte, nosso leão, e com o amor e os cuidados de mamãe e meus, ele logo estaria em casa, nosso lar novamente completo.
A alegria de tê-lo de volta era um turbilhão de emoções indescritíveis. Tudo o que meu coração desejava era passar a manhã inteira ao seu lado, mas a escola me chamava, um dever que, naquele dia, parecia um fardo pesado.
As aulas transcorreram num ritmo lento, cada minuto me afastando do aconchego do lar. Ansiava por voltar, por cuidar de papai, por absorver cada instante de sua presença. Enquanto a hora da saída não chegava, encontrei consolo na companhia de Bia, minha melhor amiga. No intervalo, a alegria contagiante dela me arrancou alguns sorrisos. Compartilhei com ela a misteriosa descoberta do diário, e para nossa surpresa, as páginas amareladas pareciam guardar segredos da própria vizinha de Bia.
— É idêntico ao diário que a minha vizinha tem... quer dizer, tinha. Lembro-me de vê-lo quando fui a uma festa de aniversário na casa dela. Havia até uma foto dela criança, segurando um diário igualzinho.
— Será que era dela? A curiosidade me picou.
— Talvez... Por que não perguntamos a ela? A sugestão de Bia acendeu uma faísca de aventura.
— Infelizmente, não poderei ir hoje, amiga. Depois da aula, irei para a casa do meu avô. A notícia de Bia foi um balde de água fria na minha empolgação.
— Ah, não, Bia! Vai me deixar sozinha nessa? Meu tom era um misto de súplica e decepção.
— Sinto muito, amiga, mas é um compromisso inadiável. Se você puder esperar até outro dia, terei o maior prazer em acompanhá-la. A voz de Bia era um pedido de desculpas sincero.
— Tudo bem, eu posso ir sozinha, não se preocupe. Mas a verdade é que a ideia de esperar me deixava inquieta, a curiosidade era um bichinho roendo minhas entranhas.
O caminho até a casa daquela senhora parecia mais longo do que o habitual, mas finalmente encontrei o endereço. Com o coração palpitando de expectativa, toquei a campainha. Uma senhora de semblante acolhedor e um sorriso nos lábios veio me receber.
— Boa tarde, dona Joana. A senhora não me conhece, mas eu encontrei seu diário e tomei a liberdade de ler algumas coisas... Espero que não se importe. Minha voz era um fio de timidez e apreensão.

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